Para mim serás sempre o Maximino.
Estava sempre ansioso para que chegassem as férias do Natal, Páscoa e de Verão, pois com estas, a Terra dos meus Pais tornava-se mais cheia, mais viva e colorida, não só por serem férias, mas porque me permitia desfrutar da companhia do meu amigo Maximino. Porém o meu sentimento era repartido por todas as crianças da aldeia, pois ele era o nosso amigo e companheiro das futeboladas, a criançada delirava no dia da sua chegada e todos nós íamos à espera da "carreira" para o vermos. Ele tinha sempre tempo para nós, ensinava-nos sempre algo de novo e a mim particularmente até me dava uns "rebuçados da Régua" que trazia também para os seus irmãos. Fomos crescendo e aprendendo com ele valores, embora com os hiatos da vida escolar, mas as férias eram sempre pequenas, as do Verão sabiam melhor pois eram maiorezinhas e fazíamos tanta coisa. Alem de jogar á bola, líamos em primeira mão o Comércio do Porto, jornal que era assinado pelo Padre da Aldeia e que o Maximino tinha que ir buscar aos "Correios" para lhe entregar. Sabíamos por este as notícias frescas sobre futebol e ciclismo quando decorria a Volta a Portugal. Íamos também ajudar o Maximino a regar a horta, íamos á missa para lhe agradar e conversávamos muito.
No início das últimas férias de Verão que passámos juntos, um dia antes da sua chegada, tinha sido enterrado o meu Pai, ele soube logo por estranhar a minha ausência na "carreira". De imediato correu para nossa casa para nos ver e tentar consolar, era da família e acompanhou-nos mais do que o habitual a mim, aos meus irmãos e à minha mãe. O alento e o saber partilhar a dor connosco, parecia que provocava em nós menos dor. Estas férias não foram alegres nem para ele nem para nós apesar do seu esforço de o não transmitir, seriam as últimas pois ele tinha acabado o curso, ao pensar nisso demonstrei-lhe o meu temor e ele com o seu sorriso habitual, sossegou-me e disse-me que ia procurar estar comigo muitas vezes. Assim aconteceu e com o decorrer do tempo e com a idade a avançar fui-me apercebendo do quanto tinha bebido dos seus valores que giravam à volta da liberdade, fraternidade, solidariedade e igualdade.
Já jovem e com dúvidas sobre a existência de Deus, tínhamos discussões e divergíamos, mas acabava por ficar mais confundido com o seu poder de argumentação e bagagem cultural. Devorava mais livros sobre o tema, para que no próximo encontro eu pudesse argumentar e dissipar as dúvidas. Apesar dos nossos esforços, nunca conseguimos chegar a comungar do mesmo pensamento neste tema.
O 25 de Abril para ele foi um dia de alegria e esperança, sonhava com um País melhor, lutou por ele dentro de muitas limitações, mas a partir daí estava disposto a cerrar os dentes e lutar pelos mais desfavorecidos, a não esquecer as suas raízes e o seu Mestre. Após esta data víamo-nos menos vezes pois o seu e o meu tempo encurtaram muito com as nossas vidas e lutas. No Natal de 1975 estivemos uns dias juntos na aldeia, falámos nos erros do PREC, nos malefícios que poderiam vir com a sombra de Novembro e nas garras que a direita fascista começava a mostrar. Felicitei-o mais uma vez pelo fabuloso discurso feito no Palácio Cristal e enalteci a célebre frase (“É mais fácil um elefante entrar num buraco de uma agulha que um rico no Reino do Céu”). Falámos muito, ele relembrou-me que a sua consciência de classe foi criada e solidificada no seio da realeza e riqueza (o seu pai tinha sido feitor agrícola dos descendentes do Conde da aldeia), estava a fazer um excelente trabalho de alfabetização nas aldeias junto de Vila Real de Trás-os-Montes, seguia na íntegra os ensinamentos da Bíblia Sagrada, o Povo ouvia-o e seguia-o, as palavras de Jesus Cristo proferidas por ele estavam a entoar nos montes, vales, aldeias, vilas e cidades,tornou-se numa ameaça para a direita fascista e para a Igreja hipócrita.
O mês de Abril de 1976 tinha começado, no dia 2 os cobardes fascistas decidiram que seria nesse dia que ia morrer, uma bomba com controlo remoto foi colocada no seu carro e decorridos poucos quilómetros explodiu e mataram-no a ele e a uma jovem estudante sua aluna a quem tinha dado boleia. Já não daria aulas de alfabetização nesse dia, nem nunca mais ensinaria ninguém a ler ou a seguir as palavras de Cristo, O MDLP liderado pelo General Spínola já falecido e por outros capangas, entre os quais figurava o Cónego Melo, diz-se terem sido os autores deste duplo assassinato, mas até hoje continuam impunes, nunca arranjaram provas, os culpados continuam inocentes. Mataram-no aos 33 anos, a mesma idade com que o seu Mestre tinha sido morto há muitos e muitos anos atrás.
A notícia da sua morte apanhou-me de surpresa, atordoou-me, revoltou-me e um bocado de mim tinha ido com ele, estava destroçado, mas contra tudo e todos (médicos incluídos), segui para Vila Real para estar as últimas horas com ele e a sua família, já não poderia obter respostas, mas desabafaria com ele.
A cidade de Vila Real acolheu dezenas de milhares de pessoas, vindas de todos os pontos do País para o último adeus ao Padre Max. Julgava que as minhas lágrimas tinham secado, mas na hora da saída do seu corpo da igreja para o cemitério, chorei copiosamente neste trajecto, a dor dilacerava-me e não conseguia controlar-me. Um desconhecido comovido com o meu sofrimento, passou-me um braço pelos ombros e perguntou-me se era meu irmão, eu balbuciei, - Sim era meu irmão meu companheiro e meu camarada.
Ainda mais comovido, abraçou-se a mim e disse-me: - És ainda um menino, mas fica a saber que homens como este nunca morrem. Vais ter toda a vida orgulho dele e procurar ser como ele. Não o mataram, semearam-no.
Ainda vi o seu corpo entrar para a cova, as primeiras pazadas de terra a soterrarem-no e depois disso entrei na sua escuridão, acordei com batas brancas à minha volta e a minha família ansiosa e preocupada à espera do veredicto dos médicos. Não havia problemas, estava fraco, tinha sido alimentado com soro e estava em condições de fazer a viagem de regresso. Sabes meu querido Maximino, nós estamos preparados para muita coisa, o tempo tudo cura, só não estamos preparados para resistir a bombas assassinas, como tu não estavas, mas a dor e a saudade perduram.
A Igreja infame e hipócrita que te ordenou Sacerdote "nem tugiu nem mungiu" com a tua morte, nem um esboço fez para que a verdade viesse ao de cima, os criminosos que te mataram só serão julgados no Juízo Final em que tu tanto acreditavas. Ah! Se me pudesses dizer aonde está o Spínola e alguns capangas já falecidos, irias de uma vez por todas limar as nossas pequenas divergências.
Para quase todos és o Padre Max, mas para mim serás sempre o MAXIMINO.
Ai! Que saudades..! Será que um dia nos vamos encontrar...?
AOS MEUS AMIGOS E AMIGOS DO PADRE MAX DA BLOGSFERA, PEÇO QUE FAÇAM UMA PEQUENA REFERÊNCIA NO DIA 2 DE ABRIL NOS SEUS BLOGS NÂO AO POLITICO (PORQUE ELE NUNCA O FOI) MAS A UM HOMEM BOM QUE SEMPRE SERVIU O POVO SEM SERVIR DELE E POR ISSO FOI ASSASSINADO.
TRANSMITAM AOS VOSSOS AMIGOS E TODOS JUNTOS VAMOS FAZER UMA PEQUENA HOMENAGEM INTERNACIONAL A ESTE PADRE QUE TÂO SÀBIAMENTE SOUBE TRANSMITIR OS ENSINAMENTOS DE JESUS CRISTO E POR ISSO MESMO NUNCA FOI RECONHECIDO NEM LEMBRADO, PELOS DIVERSOS PODERES DESTE PAÍS.